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segunda-feira, 3 de outubro de 2011

NILBO NOGUEIRA

Aprender sonhando
Projetar é sonhar, garante o educador
Nilbo Nogueira. Afinal, tem coisa
melhor que planejar e pôr em prática,
na sala de aula, atividades de acordo
com seus gostos e interesses? Mas não
basta sonhar sozinho. Para ele,
trabalhar com projetos deve ser uma
criação coletiva da coordenação, dos
professores e, principalmente, dos
alunos.
Esperando a professora dizer com que
cor pintar o céu. Parece piada, mas é
assim que o educador Nilbo Nogueira
define o sentimento de muitos alunos
nos processos tradicionais de ensino-
aprendizagem. Especialista em projetos
educacionais, ele não titubeia em
apontar o fim da passividade em favor
da interação como principal vantagem
dos projetos. Se dependesse só de sua
vontade, alunos passivos e professores
ditando regras já seriam artigos de
museu.
Mas tal conquista não é fácil, admite.
"Os alunos ainda não estão
acostumados com a autonomia (...) a
sensação é de que estão perdidos, pois
não existe, no projeto, o professor
dirigindo". Para ele, a questão é tão
séria que, em vez de ir pondo
planejamento, execução e avaliação de
projetos onde antes havia aulas e
provas, ele recomenda cautela e uma
regrinha básica: é preciso que fique
muito claro para os alunos o que é um
projeto e qual o seu papel dentro dele.
E se os alunos não se sentirem
motivados a participar? "Duvido que
eles prefiram ficar passivos dentro da
sala de aula copiando textos do
quadro-negro", desafia de pronto.
Segundo ele, o problema é outro. Para
explicar o papel do aluno, é preciso
primeiro que os professores entendam
seu próprio papel nessa dinâmica. Ele
lamenta que ainda haja educadores
que resistam aos projetos, "achando
que a escola está arrumando mais
serviço para eles".
Para Nilbo, cabe ao professor apenas e
tão somente mediar e facilitar as etapas
do projeto. Quem interage e trabalha,
na verdade, são os alunos. Segundo
ele, às vezes o equívoco é tão grande
que "alguns professores estão
praticando a dinâmica de projetos em
sala de aula solicitando a seus alunos
atividades planejadas por eles ou pela
coordenação pedagógica da escola".
"Alguns esquecem que projetar é
sonhar e que ninguém pode realizar o
sonho do outro", conclui.
Na entrevista a seguir, Nilbo Nogueira
fala da necessidade de superar os
modismos e mal-entendidos que
envolvem os projetos e cita a Internet
como um instrumento capaz de
potencializar pesquisas, interações e
trocas de informações para além dos
muros da escola. A propósito, o Portal
Educacional acaba de lançar o
Concurso NetBrasil 2002, que vai
premiar dois projetos educacionais que
usarem a Internet com essa finalidade.
Qual a principal vantagem em se
trabalhar por meio de projetos
educacionais?
Impossível pensar o processo de
ensino-aprendizagem sem múltiplas
interações. O ensino formal, em que o
aluno não participa e não interage em
seu processo de construção do
conhecimento, é algo mais do que
questionável atualmente. Dessa forma,
podemos citar, dentre várias vantagens
dos projetos, a mais importante, que é
a troca da passividade do aluno pela
interação. Os projetos, com certeza,
parecem suprir essa necessidade de
fazer com que o aluno rompa com sua
passividade e interaja de diferentes
maneiras em todas as etapas de sua
execução.
Existem regras básicas que devem
fazer parte de qualquer projeto,
independentemente do tema
tratado?
Acredito que sim. De certa forma,
nossos alunos ainda não estão
acostumados com a autonomia, e, nos
projetos, precisamos trabalhar com
essa questão. Se não estabelecermos
como primeira regra contar aos nossos
alunos o que é um projeto e como se
trabalha com o ato de projetar, eles
terão a sensação de que estão
"perdidos", pois não existe, no projeto,
o professor dirigindo e ditando as
tarefas, as atividades, a cor da caneta, a
forma da maquete, o tipo de cartaz,
etc. Entendido primeiramente o que é
um projeto e qual o seu papel dentro
dessa dinâmica, as regras seguintes são
aquelas relacionadas às etapas de um
projeto, que são norteadoras para seu
planejamento, execução, depuração,
apresentação e avaliação.
A interdisciplinaridade ou a
multidisciplinaridade é um
requisito essencial de qualquer
projeto?
Seria se todos os projetos fossem
interdisciplinares. Na prática, um
projeto pode iniciar com apenas um
professor de uma única disciplina
tratando de um determinado conteúdo
programático. No decorrer do projeto,
conforme interesses e necessidades,
outros professores e outras disciplinas
podem interagir com o projeto em
questão e, dependendo da forma, a
multi ou a interdisciplinaridade
poderão acontecer espontaneamente.
De nada adianta a escola estabelecer
como tema único para todas as séries e
professores que o projeto desse
bimestre será "Brasil 500 Anos" (ainda
bem que já acabou esse modismo); um
tema único de um projeto para toda
escola não garantirá necessariamente a
prática da interdisciplinaridade. Já
presenciei inúmeros projetos que
iniciaram em uma única disciplina e
depois abrangeram outras, por
necessidade e interesse de alunos e
professores, assim como projetos de
temas únicos em escolas que
pretendiam praticar a
interdisciplinaridade e, no final, cada
professor trabalhou o tema de forma
isolada.
Qual a relação entre projetos e
temas transversais?
Embora isso não seja uma regra, os
projetos, na prática, têm ocorrido em
um determinado período letivo. Por
exemplo: no primeiro bimestre ou no
segundo semestre, etc. Dessa forma,
um projeto temático não vai
contemplar necessariamente o ano
letivo inteiro. Quando nos referimos
aos temas transversais, esperamos que,
na prática, esse tema seja abordado, se
possível, durante todo o ano letivo e
por todos os professores. Espera-se que
essa abordagem seja realizada pelos
professores de forma sutil, incorporada
ao seu conteúdo. Não podemos
imaginar um tema transversal sendo
tratado como um "caroço", ou seja, no
meio do conteúdo, o professor dá uma
parada, trata do tema transversal e
depois volta a falar de seu conteúdo
novamente, sem estabelecer nenhum
tipo de relação. Fazendo uma metáfora,
podemos imaginar uma disciplina
como um bolo em que os conteúdos
são seus ingredientes: a farinha, os
ovos, etc. não aparecem isoladamente,
mas sim na composição da massa.
Imagine agora comer um bolo e
encontrar um "caroço" de farinha! O
tema transversal tratado de forma
isolada do conteúdo tem essa mesma
característica do "caroço" de farinha.
Juntando essas situações, poderíamos
questionar: é possível trabalhar os
temas transversais com projetos? E a
resposta seria sim, desde que
contemplássemos as questões da forma
(projeto) com a necessidade de
abordagem (transversal).
Que conselhos o senhor daria ao
professor que resiste a trabalhar
com projetos e a quem está
aderindo a esse trabalho pela
primeira vez?
Não imaginar que o projeto é mais
uma atividade que ele vai ter de fazer
como tantas outras e que a escola está
arrumando mais serviço para ele. No
projeto, o professor não terá mais
serviço, pois quem na realidade deve
interagir e trabalhar são os alunos. O
professor simplesmente deverá
orquestrar essa atividade, mediando e
facilitando suas etapas. Àquele
professor que resiste a trabalhar com
projeto, achando que terá mais serviço,
eu aconselho estudar um pouco mais
sobre o que é realmente um projeto,
pois só assim perceberá que não é essa
a proposta. Muitos resistem por causa
dos conteúdos. Aconselho, nesses
casos, que pensem então em trabalhar
os conteúdos com projetos ou projetos
dos conteúdos. Particularmente, acho
que a resistência maior está no
desconhecido e também na
necessidade de ser mais flexível, já que
é impossível trabalhar com projetos de
forma rígida e inflexível. Num projeto,
estamos abertos a tudo, pois projetar é
uma referência ao futuro, que, em
muitos casos, ainda é desconhecido.
Que atitude (ou mudança de
atitude) o professor deve ter ao
assumir um projeto?
Ele deve simplesmente ser mediador e
facilitador de todas as etapas de um
projeto. Nessa dinâmica, ele não dita
regras nem conteúdos, mas, sim,
orquestra a projeção de seus alunos.
Como encaixar o trabalho com
projetos no cronograma apertado
e no currículo rígido das escolas?
É difícil resolver essa questão, mas não
impossível. Então, resta-nos questionar
a forma de trabalho com esses
conteúdos, bem como a real
necessidade de alguns tópicos desses.
De nada adianta ter um conteúdo
programático "apertado" e o aluno
aprender pouco de muito, ao passo
que poderia aprender muito de pouco.
Questiono particularmente não os
conteúdos, mas, sim, a forma como são
tratados. Tomando como referência os
PCNs, verificamos que os conteúdos
devem ser trabalhados de forma
conceitual, procedimental e atitudinal.
Na prática, o professor domina bem a
forma de ministrar seus conteúdos
conceitualmente. Mas como está
trabalhando estes de forma
procedimental e atitudinal? Uma boa
saída para esses casos são os projetos,
já que, ao projetar, os alunos
demonstram atitudes e, ao executá-lo,
trabalham com procedimentos.
Como despertar o interesse dos
alunos se eles já estiverem
acostumados à rotina de classes e
disciplinas?
Começando aos poucos e devagar, de
forma que eles rompam com esses
"vícios" adquiridos. No primeiro
momento, é complicado trabalhar com
autonomia com quem sempre esperou
a professora dizer de que cor era para
pintar o céu. Volto a relembrar a regra
básica que já mencionei, que é contar
ao aluno o que é um projeto e como se
trabalha com um projeto. Entendido
qual é a proposta, duvido que eles
prefiram ficar passivos dentro da sala
de aula copiando textos e mais textos
do quadro-negro do que trabalhar com
autonomia, planejando e realizando
aquilo que têm vontade e pelo que têm
interesse.
É necessário haver classes
específicas para os projetos? Ou,
pouco a pouco, os projetos
acabarão substituindo o ensino
baseado em disciplinas?
Existe o ideal e o real. Hoje, o real é
conseguir trabalhar com projetos
dentro das disciplinas, junto com os
conteúdos, e durante as aulas
regulares. Espero que um dia
consigamos chegar ao ideal, ou seja, o
projeto englobando as disciplinas de
forma integrada, sem haver a
fragmentação das diferentes áreas do
conhecimento. Algumas escolas já
possuem uma "disciplina" chamada
Projeto, que media todas as propostas
das diferentes disciplinas.
Aparentemente, o resultado parece ser
interessante.
Como avaliar um projeto?
Existe a avaliação do projeto e das
aquisições de conteúdos. Ao término
da apresentação do projeto, considero
como etapa final a avaliação, que na
prática é uma sessão, mediada pelo
professor, em que cada aluno faz sua
auto-avaliação e autocrítica e,
posteriormente, avalia e critica (com
sugestões) os demais projetos. Como
ferramenta de avaliação, podemos
utilizar um "processofólio", que é uma
pasta em que cada aluno registra todas
as ações, descobertas, planejamentos,
atividades, rascunhos, interesses, etc.
Esse instrumento acaba sendo um
registro passo a passo de todo o
processo do projeto em questão, bem
como o registro da evolução que
ocorreu durante a seqüência de
realização dos diferentes projetos.
Pode-se dizer que um trabalho
exclusivamente por projetos é mais
eficaz?
Difícil afirmar isso. Mesmo sendo um
apaixonado e partidário da utilização
dos projetos, tenho de reconhecer que
existem outras possibilidades de
interação dos alunos e outros
processos que auxiliam na
aprendizagem. Posso afirmar, sem
sombra de dúvidas, que os projetos são
uma das formas eficazes.
Na sua opinião, a Internet pode
ajudar a execução de projetos?
Como?
Pode e muito. Da mesma forma que
trabalhamos com projetos em um
espaço real de aprendizagem, também
podemos trabalhar em um espaço
virtual (ciberespaço) de aprendizagem.
Os mesmos projetos que realizavam
atividades em papel, isopor, cartolina,
utilizando tintas, encenações,
entrevistas gravadas em vídeo, etc.,
podem ser trabalhados com produção
de documentos na Web. A diferença é
que a apresentação final não
necessariamente ocorrerá no espaço
real (da escola), mas sim no
ciberespaço, por meio de sites e home
pages. Acho que a Internet não está
sendo utilizada em todo o seu
potencial. Muitos ainda a encaram
como fonte de pesquisa e coleta de
informações, esquecendo-se do rico
arsenal de ferramentas de comunicação
que podem propiciar um trabalho
cooperativo. Dessa forma, os projetos
podem ser trabalhados além das
paredes da escola e por grupos
distintos de diferentes regiões.
Lentamente, as coisas estão
caminhando para um trabalho no
ciberespaço e, conseqüentemente, na
colaboração da construção de uma
inteligência coletiva. Percebe-se a
preocupação de muitos professores em
desvendar esses novos "mistérios".
Particularmente, tenho presenciado
isso em uma das disciplinas (Internet
Pedagógica) que leciono num curso de
pós-graduação.
É válido que o professor recorra a
projetos sugeridos em revistas ou
sites, adaptando-os à realidade
dos alunos, mesmo que ele tenha
dúvidas sobre como criar projetos
próprios?
Não acredito que modelos copiados
surtam efeito de projetos, mas, sim, de
atividades e tarefas solicitadas aos
alunos. Para o professor que nunca
trabalhou com projeto, admito até a
possibilidade de copiar e utilizar uma
ou duas vezes um "modelo", mas a
partir disso, vejo a necessidade de
trabalhar na criação de projetos de
forma coletiva, principalmente com
seus alunos. Se projetar é sonhar, fica,
então, a pergunta: Como poderei
realizar "sonhos" de terceiros?
Sobre essas adaptações, um
mesmo projeto pode se aplicar a
todas as idades, apenas variando o
grau de dificuldade, como sugeriu
Brunner em seu "currículo espiral"?
Sim. Acredito que as adaptações de
intensidade sobre um mesmo tema são
fundamentais. Mas acho que proposto
o tema e perguntado aos alunos quais
seriam suas vontades, necessidades,
interesses, etc., eles mesmo acabarão
norteando a profundidade e
abrangência do projeto. Dessa forma,
creio que um tema único pode ser
aplicado a diferentes faixas etárias, pois,
em cada uma delas, surgirão
naturalmente os diferentes interesses,
variando conforme suas necessidades
sobre a problemática proposta.
Muitos professores já fazem
projetos sem saberem que o estão
fazendo, outros o fazem apenas no
papel (muitas vezes são obrigados
a fazer). Qual a mudança
necessária na formação de
professores para que a pedagogia
de projetos realmente faça parte
da rotina de nossas escolas?
Para se praticar a dinâmica de trabalho
com projetos, é necessário previamente
estudar, ler e entender essa proposta
de atuação em sala de aula. Acho que
a falta de entendimento e
compreensão está levando alguns
professores à pratica de um modismo.
Alguns professores estão praticando a
dinâmica de projetos em sala de aula
de forma equivocada, solicitando a seus
alunos atividades planejadas por eles
ou pela coordenação pedagógica da
escola. Alguns esquecem que projetar é
sonhar e que ninguém pode realizar o
sonho do outro. Se for para sonhar na
escola, que seja, então, um sonho
coletivo da coordenação, dos
professores e também dos alunos, pois,
se não for dessa forma, os alunos
estarão apenas realizando atividades
que alguém propôs. Nesse caso, não
estaremos trabalhando com projetos,
estaremos apenas utilizando modelos e
brincando de projetar.nalidade.
Qual a principal vantagem em se
trabalhar por meio de projetos
educacionais?
Impossível pensar o processo de
ensino-aprendizagem sem múltiplas
interações. O ensino formal, em que o
aluno não participa e não interage em
seu processo de construção do
conhecimento, é algo mais do que
questionável atualmente. Dessa forma,
podemos citar, dentre várias vantagens
dos projetos, a mais importante, que é
a troca da passividade do aluno pela
interação. Os projetos, com certeza,
parecem suprir essa necessidade de
fazer com que o aluno rompa com sua
passividade e interaja de diferentes
maneiras em todas as etapas de sua
execução.
Existem regras básicas que devem
fazer parte de qualquer projeto,
independentemente do tema
tratado?
Acredito que sim. De certa forma,
nossos alunos ainda não estão
acostumados com a autonomia, e, nos
projetos, precisamos trabalhar com
essa questão. Se não estabelecermos
como primeira regra contar aos nossos
alunos o que é um projeto e como se
trabalha com o ato de projetar, eles
terão a sensação de que estão
"perdidos", pois não existe, no projeto,
o professor dirigindo e ditando as
tarefas, as atividades, a cor da caneta, a
forma da maquete, o tipo de cartaz,
etc. Entendido primeiramente o que é
um projeto e qual o seu papel dentro
dessa dinâmica, as regras seguintes são
aquelas relacionadas às etapas de um
projeto, que são norteadoras para seu
planejamento, execução, depuração,
apresentação e avaliação.
A interdisciplinaridade ou a
multidisciplinaridade é um
requisito essencial de qualquer
projeto?
Seria se todos os projetos fossem
interdisciplinares. Na prática, um
projeto pode iniciar com apenas um
professor de uma única disciplina
tratando de um determinado conteúdo
programático. No decorrer do projeto,
conforme interesses e necessidades,
outros professores e outras disciplinas
podem interagir com o projeto em
questão e, dependendo da forma, a
multi ou a interdisciplinaridade
poderão acontecer espontaneamente.
De nada adianta a escola estabelecer
como tema único para todas as séries e
professores que o projeto desse
bimestre será "Brasil 500 Anos" (ainda
bem que já acabou esse modismo); um
tema único de um projeto para toda
escola não garantirá necessariamente a
prática da interdisciplinaridade. Já
presenciei inúmeros projetos que
iniciaram em uma única disciplina e
depois abrangeram outras, por
necessidade e interesse de alunos e
professores, assim como projetos de
temas únicos em escolas que
pretendiam praticar a
interdisciplinaridade e, no final, cada
professor trabalhou o tema de forma
isolada.
Qual a relação entre projetos e
temas transversais?
Embora isso não seja uma regra, os
projetos, na prática, têm ocorrido em
um determinado período letivo. Por
exemplo: no primeiro bimestre ou no
segundo semestre, etc. Dessa forma,
um projeto temático não vai
contemplar necessariamente o ano
letivo inteiro. Quando nos referimos
aos temas transversais, esperamos que,
na prática, esse tema seja abordado, se
possível, durante todo o ano letivo e
por todos os professores. Espera-se que
essa abordagem seja realizada pelos
professores de forma sutil, incorporada
ao seu conteúdo. Não podemos
imaginar um tema transversal sendo
tratado como um "caroço", ou seja, no
meio do conteúdo, o professor dá uma
parada, trata do tema transversal e
depois volta a falar de seu conteúdo
novamente, sem estabelecer nenhum
tipo de relação. Fazendo uma metáfora,
podemos imaginar uma disciplina
como um bolo em que os conteúdos
são seus ingredientes: a farinha, os
ovos, etc. não aparecem isoladamente,
mas sim na composição da massa.
Imagine agora comer um bolo e
encontrar um "caroço" de farinha! O
tema transversal tratado de forma
isolada do conteúdo tem essa mesma
característica do "caroço" de farinha.
Juntando essas situações, poderíamos
questionar: é possível trabalhar os
temas transversais com projetos? E a
resposta seria sim, desde que
contemplássemos as questões da forma
(projeto) com a necessidade de
abordagem (transversal).
Que conselhos o senhor daria ao
professor que resiste a trabalhar
com projetos e a quem está
aderindo a esse trabalho pela
primeira vez?
Não imaginar que o projeto é mais
uma atividade que ele vai ter de fazer
como tantas outras e que a escola está
arrumando mais serviço para ele. No
projeto, o professor não terá mais
serviço, pois quem na realidade deve
interagir e trabalhar são os alunos. O
professor simplesmente deverá
orquestrar essa atividade, mediando e
facilitando suas etapas. Àquele
professor que resiste a trabalhar com
projeto, achando que terá mais serviço,
eu aconselho estudar um pouco mais
sobre o que é realmente um projeto,
pois só assim perceberá que não é essa
a proposta. Muitos resistem por causa
dos conteúdos. Aconselho, nesses
casos, que pensem então em trabalhar
os conteúdos com projetos ou projetos
dos conteúdos. Particularmente, acho
que a resistência maior está no
desconhecido e também na
necessidade de ser mais flexível, já que
é impossível trabalhar com projetos de
forma rígida e inflexível. Num projeto,
estamos abertos a tudo, pois projetar é
uma referência ao futuro, que, em
muitos casos, ainda é desconhecido.
Que atitude (ou mudança de
atitude) o professor deve ter ao
assumir um projeto?
Ele deve simplesmente ser mediador e
facilitador de todas as etapas de um
projeto. Nessa dinâmica, ele não dita
regras nem conteúdos, mas, sim,
orquestra a projeção de seus alunos.
Como encaixar o trabalho com
projetos no cronograma apertado
e no currículo rígido das escolas?
É difícil resolver essa questão, mas não
impossível. Então, resta-nos questionar
a forma de trabalho com esses
conteúdos, bem como a real
necessidade de alguns tópicos desses.
De nada adianta ter um conteúdo
programático "apertado" e o aluno
aprender pouco de muito, ao passo
que poderia aprender muito de pouco.
Questiono particularmente não os
conteúdos, mas, sim, a forma como são
tratados. Tomando como referência os
PCNs, verificamos que os conteúdos
devem ser trabalhados de forma
conceitual, procedimental e atitudinal.
Na prática, o professor domina bem a
forma de ministrar seus conteúdos
conceitualmente. Mas como está
trabalhando estes de forma
procedimental e atitudinal? Uma boa
saída para esses casos são os projetos,
já que, ao projetar, os alunos
demonstram atitudes e, ao executá-lo,
trabalham com procedimentos.
Como despertar o interesse dos
alunos se eles já estiverem
acostumados à rotina de classes e
disciplinas?
Começando aos poucos e devagar, de
forma que eles rompam com esses
"vícios" adquiridos. No primeiro
momento, é complicado trabalhar com
autonomia com quem sempre esperou
a professora dizer de que cor era para
pintar o céu. Volto a relembrar a regra
básica que já mencionei, que é contar
ao aluno o que é um projeto e como se
trabalha com um projeto. Entendido
qual é a proposta, duvido que eles
prefiram ficar passivos dentro da sala
de aula copiando textos e mais textos
do quadro-negro do que trabalhar com
autonomia, planejando e realizando
aquilo que têm vontade e pelo que têm
interesse.
É necessário haver classes
específicas para os projetos? Ou,
pouco a pouco, os projetos
acabarão substituindo o ensino
baseado em disciplinas?
Existe o ideal e o real. Hoje, o real é
conseguir trabalhar com projetos
dentro das disciplinas, junto com os
conteúdos, e durante as aulas
regulares. Espero que um dia
consigamos chegar ao ideal, ou seja, o
projeto englobando as disciplinas de
forma integrada, sem haver a
fragmentação das diferentes áreas do
conhecimento. Algumas escolas já
possuem uma "disciplina" chamada
Projeto, que media todas as propostas
das diferentes disciplinas.
Aparentemente, o resultado parece ser
interessante.
Como avaliar um projeto?
Existe a avaliação do projeto e das
aquisições de conteúdos. Ao término
da apresentação do projeto, considero
como etapa final a avaliação, que na
prática é uma sessão, mediada pelo
professor, em que cada aluno faz sua
auto-avaliação e autocrítica e,
posteriormente, avalia e critica (com
sugestões) os demais projetos. Como
ferramenta de avaliação, podemos
utilizar um "processofólio", que é uma
pasta em que cada aluno registra todas
as ações, descobertas, planejamentos,
atividades, rascunhos, interesses, etc.
Esse instrumento acaba sendo um
registro passo a passo de todo o
processo do projeto em questão, bem
como o registro da evolução que
ocorreu durante a seqüência de
realização dos diferentes projetos.
Pode-se dizer que um trabalho
exclusivamente por projetos é mais
eficaz?
Difícil afirmar isso. Mesmo sendo um
apaixonado e partidário da utilização
dos projetos, tenho de reconhecer que
existem outras possibilidades de
interação dos alunos e outros
processos que auxiliam na
aprendizagem. Posso afirmar, sem
sombra de dúvidas, que os projetos são
uma das formas eficazes.
Na sua opinião, a Internet pode
ajudar a execução de projetos?
Como?
Pode e muito. Da mesma forma que
trabalhamos com projetos em um
espaço real de aprendizagem, também
podemos trabalhar em um espaço
virtual (ciberespaço) de aprendizagem.
Os mesmos projetos que realizavam
atividades em papel, isopor, cartolina,
utilizando tintas, encenações,
entrevistas gravadas em vídeo, etc.,
podem ser trabalhados com produção
de documentos na Web. A diferença é
que a apresentação final não
necessariamente ocorrerá no espaço
real (da escola), mas sim no
ciberespaço, por meio de sites e home
pages. Acho que a Internet não está
sendo utilizada em todo o seu
potencial. Muitos ainda a encaram
como fonte de pesquisa e coleta de
informações, esquecendo-se do rico
arsenal de ferramentas de comunicação
que podem propiciar um trabalho
cooperativo. Dessa forma, os projetos
podem ser trabalhados além das
paredes da escola e por grupos
distintos de diferentes regiões.
Lentamente, as coisas estão
caminhando para um trabalho no
ciberespaço e, conseqüentemente, na
colaboração da construção de uma
inteligência coletiva. Percebe-se a
preocupação de muitos professores em
desvendar esses novos "mistérios".
Particularmente, tenho presenciado
isso em uma das disciplinas (Internet
Pedagógica) que leciono num curso de
pós-graduação.
É válido que o professor recorra a
projetos sugeridos em revistas ou
sites, adaptando-os à realidade
dos alunos, mesmo que ele tenha
dúvidas sobre como criar projetos
próprios?
Não acredito que modelos copiados
surtam efeito de projetos, mas, sim, de
atividades e tarefas solicitadas aos
alunos. Para o professor que nunca
trabalhou com projeto, admito até a
possibilidade de copiar e utilizar uma
ou duas vezes um "modelo", mas a
partir disso, vejo a necessidade de
trabalhar na criação de projetos de
forma coletiva, principalmente com
seus alunos. Se projetar é sonhar, fica,
então, a pergunta: Como poderei
realizar "sonhos" de terceiros?
Sobre essas adaptações, um
mesmo projeto pode se aplicar a
todas as idades, apenas variando o
grau de dificuldade, como sugeriu
Brunner em seu "currículo espiral"?
Sim. Acredito que as adaptações de
intensidade sobre um mesmo tema são
fundamentais. Mas acho que proposto
o tema e perguntado aos alunos quais
seriam suas vontades, necessidades,
interesses, etc., eles mesmo acabarão
norteando a profundidade e
abrangência do projeto. Dessa forma,
creio que um tema único pode ser
aplicado a diferentes faixas etárias, pois,
em cada uma delas, surgirão
naturalmente os diferentes interesses,
variando conforme suas necessidades
sobre a problemática proposta.
Muitos professores já fazem
projetos sem saberem que o estão
fazendo, outros o fazem apenas no
papel (muitas vezes são obrigados
a fazer). Qual a mudança
necessária na formação de
professores para que a pedagogia
de projetos realmente faça parte
da rotina de nossas escolas?
Para se praticar a dinâmica de trabalho
com projetos, é necessário previamente
estudar, ler e entender essa proposta
de atuação em sala de aula. Acho que
a falta de entendimento e
compreensão está levando alguns
professores à pratica de um modismo.
Alguns professores estão praticando a
dinâmica de projetos em sala de aula
de forma equivocada, solicitando a seus
alunos atividades planejadas por eles
ou pela coordenação pedagógica da
escola. Alguns esquecem que projetar é
sonhar e que ninguém pode realizar o
sonho do outro. Se for para sonhar na
escola, que seja, então, um sonho
coletivo da coordenação, dos
professores e também dos alunos, pois,
se não for dessa forma, os alunos
estarão apenas realizando atividades
que alguém propôs. Nesse caso, não
estaremos trabalhando com projetos,
estaremos apenas utilizando modelos e
brincando de projetar.

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